éramos muitos; éramos nós e o que inventávamos para nós; éramos tantos... os dias passavam sem compromissos nos levando sempre às pernas do avô que nos contava histórias pra dormir; jamais dormir sem aquele afago...o mundo ainda não era grande e nele cabia todos nossos desejos; assim como na cama cabíamos todos bem juntinhos; subir nas árvores, colher frutas, escondermo-nos atrás dos pés de jabuticabas pretas e enormes, e ali adoçar a vida enquanto esperávamos...os gatos pela casa, os pássaros lá fora, os cães dos quais esqueci os nomes; laranja, mixirica, melancia, goiaba, araçá, carambola, mandioca, arroz pra socar no pilão, a roupa pra lavar perto do poço, o saci à espreita, o tum tum do coração...mas o mundo cresceu; e alguém se foi; e depois mais um; muita dor, muita saudade; e num mundo tão grande os sonhos ficam tão pequenos...e nós também crescemos, e ficamos tão diferentes, já nem nos reconhecemos; e eu pendurei a saudade num alto pé de laranja lima; eu fico embaixo, o avô me joga as laranjas...e saio daquele mundo, e compro um pé de medo, que não dá frutos mas não morre; só algumas pessoas morrem, e levam pedaços de mim; algumas eu mesma mato, e carrego os cadáveres que volta e meia vêm pro meu quintal dançar em frente aos meus olhos; e hoje a vida acontece em volta de memórias e parece que nada mais há por vir; o futuro ficou lá atras.
-fls-
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