A estrada é um tanto sinuosa, e a previsão do que está por vir é incerta.
Mas caminho por ela um tanto quanto confiante, pois imaginar que depois da curva há
sempre um bonito encontro, um dia de sol, um abraço apertado, um "the end" americano é coisa que sei fazer com precisão. Aprendi a imaginar tão bem que já confundo habitualmente sonho e realidade. Meus pés já habitam o chão ou as estrelas numa fração de segundos.
Se tantas vezes é preciso deixar aqui ou ali uma parte da bagagem para tornar a viagem mais leve, difícil é saber qual fração do todo largar sem que a pretendida leveza se torne um grande fardo. Não é fácil ir arrancando partes de si, abandonando detalhes que nos caracterizam desde um tempo em que viver era apenas ir abrindo e fechando os olhos com o passar dos dias e das noites.
Alguns pedaços dos quais precisamos nos desfazer deixam um vazio doloroso. Fica uma ausência que dói. É como tirar a essência do perfume e transformá-lo apenas num liquido
inodoro. O que será do perfume sem a parte que o identifica mais notoriamente?
Em meio a este apartar-se de si, fica também a dúvida : qual parte de mim me levará ao céu ou ao inferno? Aqui eu sei quais minhas virtudes salvadoras e meus defeitos condenatórios. Mas e o outro céu; e o outro inferno? O que preciso preservar para ganhar um ou outro? Não serão minhas virtudes e meus defeitos tão unificados numa grande pretensão de estar além de um julgamento que eu talvez não consiga sobreviver sem qualquer um deles? O que devo matar em mim, ou preservar, para chegar perto de uma possível absolvição? E eu nem sei se pretendo realmente a absolvição que me garanta um resto de existência insípida ou se prefiro ser sentenciada ao fogo eterno por todos os meus atos apaixonados que me garantiram até aqui a sobrevivência num mundo cheio de verdades inventadas.
-fls-
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