sábado, 6 de maio de 2017










era pra ser um grande amor
mas as palavras
de efeito rebote
adversas
perversas
são tomadas via oral

gota a gota

efeito colateral
mudez

e o peristaltismo
no oco do estomago
digere o bicarbonato de sódio
pra não vomitar
palavras ácidas de ódio
-fls-

sexta-feira, 14 de abril de 2017

À força arrancaram de seu ventre o rebento. Levaram pra distante de seus olhos o tesouro que ali guardava; e ali entre sangue  um
Aos gritos lhe roubaram o encantamento do milagre; jogaram brasa no chão novo que seus pés haveriam de pisar. Cantava-lhe nas noites frias e longas as mais doces cantigas de ninar.
Até o raiar dos dias ou do escurecer das noites, a seu lado, espiou sua respiração cuidadosamente.
A  vida seguindo impiedosamente cortava com sua navalha o sonho no qual segurava as mãos macias do seu amor, colocando-se à frente nas ventanias e tempestades.
Num mundo sombrio cercado de medo, tornou-se, propriamente, o pior pesadelo de sua  maior riqueza.
As palavras pontiagudas entram fazendo estardalhaço nas células do ouvido, estilhaçando todo e qualquer sentimento à sua volta. Não,não é suicídio, é crime de ódio.
No suicídio a alma fenece e descansa. No ódio segue erosada.
E na sequência das horas, na escuridão ou na clareza dos dias, está sempre o medo remetendo ao que passou ou ao que virá. Tanto faz; ele sempre esteve e sempre vai estar armado até os dentes, apontando sua arma que dispara discórdia, solidão, pecados que não terão perdão.
Constrói-se a vida mesmo assim, em torno das pedras que batem à janela, ameaçando jogar os cacos de vidro na cortina com a qual se protege os tesouros.
Não há tempo para fugir, nem portas por onde sair. É preciso arranhar a pele com as unhas pra se sentir forte diante do perigo que mata o sonho.
Não há caminho de volta, nem para onde ir; é pela contra mão que o terror entra, atingindo de frente todos em seu caminho. As lembranças a carregar serão aquelas que cada um escolher.
As verdades não virão à tona, nem os disfarces que se criou para sobreviver em meio à tempestade. As ondas gigantes que inundaram a casa e trouxeram o tsunami voltam sempre, às vezes disfarçadas, mas são sempre as mesmas, fazendo da história um permanente funeral de afogados.
-fls-

sexta-feira, 20 de maio de 2016






o silêncio fez-se adeus
de joelhos suplico a Deus
me proteja na saudade
-fls-








                                                              
se me encontrares, por favor

não me tomes, fecha o sorriso
quero estar perdida
-fls-

quarta-feira, 27 de abril de 2016








chovia
as gotas na parte de fora do vidro do carro embaçavam o campo de visão
mesmo assim olhava longe; nada via, estava no quarto onde dormia
e todas as noites os fantasmas voltavam; sentia seus passos, o barulho das gavetas que se abriam
e também lá fora, na escuridão da noite algumas almas sondavam pelas frestas da janela veneziana
o medo morava dentro
e ia junto no sono, no sonho; cavalgava um cavalo sem rosto e trazia frio para seu corpo
a estrada paralela era de ferro, e ali caminhava desafiando a sorte
na outra estrada, transversal, o asfalto era quente e os perigos rondavam em quatro rodas, e seus cavaleiros sem rosto eram também portadores de frio
habitava um pequeno pedaço do imenso mundo que havia lá fora, onde os gatos e os porcos gritavam, e as pessoas mentiam

e num tempo tardio, olhando as gotas de chuva no pára-brisa do carro; o vidro embaçado pelo vapor da respiração pausada
percebe que já não há fantasmas sem rosto; todos têm semblantes pecadores
e é preciso purgar o espírito com a pena máxima
que não é de morte
mas sim de vida
-fls-

quarta-feira, 2 de março de 2016

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016







sangrou.e junto ao sangue escorria a vida que guardava.escorria sem choro sem dor sem medo.apenas lamento.teria que lacrar as roupas não usadas os dias não passeados os planos não cumpridos as palavras não ditas os amores não amados os abraços não dados...toda uma vida.
ninguém a viu sangrar.o líquido vital escorreu invisível pelas pernas pelas frestas pelas ruas pelas portas pelos becos pela vida.
agora já era tarde.o fruto vazou escureceu morreu.precisa cobrir de luto e terra o rebento perdido e dar ao tempo tempo para trazer algum conforto.
-fls-